Três ou Quatro Doses de Esperança


Num destes dias, a propósito do dia mundial da poesia, creio eu, fui tomar um café e ofereceram-me um poema. É uma maneira simpática de começar o dia, seja ele mundial da poesia ou de outra coisa qualquer, pois isso, bem ou mal, é coisa que me é relativamente indiferente.

Também por estes dias me ofereceram o livro do Gonçalo M. Tavares, Uma Viagem à Índia, que vou lendo (não acabei) com a convicção de estar a conviver com a obra de um dos mais extraordinários vultos da literatura e da cultura portuguesa e europeias, crença que já tinha antes desta jornada com Bloom. Vasco Graça Moura disse deste livro que “é um livro extraordinário” e que “dentro de cem anos ainda haverá teses de doutoramento sobre passagens e fragmentos”. Não duvido. Para este autor, de uma escrita original e única no estilo, tenho a expectativa de o ver reconhecido ao nível de Pessoa, como um dos incontornáveis nomes da nossa literatura. Tudo o mais do muito que já foi e há-de ser dito sobre Gonçalo M. Tavares e a sua escrita fica por conta dos entendidos. De mim fica a recomendação de um olhar sobre uma das boas coisas que temos.

Por cá, ressurgiu da degradação a que tinha sido abandonado, impecável e restaurado, o antigo posto de viação e trânsito, que também já foi de turismo. Fico satisfeita com a remoção daquela triste mancha do coração da cidade e com esperança de que para aquele espaço seja encontrado um destino compatível com a sua localização estratégica no Rossio Marquês de Pombal (e, já agora, que para o velho coreto, um pouco mais adiante também ele a reclamar igual cuidado, haja também um pouco mais de carinho).

Sem que eu me possa gabar da iniciativa, aproveitei o prenúncio da Primavera – que, entretanto, chegou, pelo menos ao calendário – para ir ao Castelo e ver na Galeria D. Dinis a mostra “A Barca dos Sentidos”, com trabalhos do pintor Oliveira Tavares e do escultor João Sotero, que podem se vistos até 23 de Abril. De caminho dei conta da apresentação, no Museu Municipal, da I Mostra de Artes Plásticas de Estremoz, uma exposição colectiva de artistas do concelho, que igualmente pode ser visitada até 23 de Abril e revisitei a ElaPedra, no Largo do Castelo, loja ou galeria (o que lhe queiram chamar) onde podem ser encontrados, além da predominante escultura em mármore, peças deste e de outros materiais de um número crescente de artistas, reunidas num espaço moderno e oxigenado de muito bom gosto.

Tudo isto existe efectivamente, subjugado pelo quotidiano avassalador da crise, das preocupações e das dificuldades que são invariavelmente mais eficazes a prender a atenção do que as coisas boas e belas que temos a contrastar com a aridez e desesperança que fustigam os nossos dias. Infelizmente, vezes demais, passamos ao lado do que temos de bom, sem o ver e isso, naturalmente, é coisa que tem de mudar.
Ivone Carapeto
Publicado no nº 24 do Jornal E

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