O CENTENÁRIO DA REPÚBLICA

Comemora-se este mês o centenário da proclamação da República em Portugal.
E nada como uma comparação entre o Portugal de 1910 e o Portugal de 2010 para nos ajudar a perceber de onde vimos, onde estamos e para onde vamos.
O Portugal do início do século XX era um país à procura de si próprio: as crises sucediam-se; o Brasil tinha sido perdido em 1822, havia quase cem anos, as lutas liberais tinham trazido, na segunda metade do século anterior, a alternância de poder e alguma prosperidade.
Na Europa vivia-se um longo período de paz; desde 1870 que não havia grandes conflitos, e, como Eça de Queirós já tinha comentado anos antes, "podia viajar-se tranquilamente de Lisboa a Moscovo com um simples passaporte". O reinado do carvão estava no seu auge. Carvão que tinha sido responsável pela revolução industrial, mas tinha permitido também o aparecimento de uma nova classe, os proletários, com os conflitos inerentes a uma condição social precária. Adensavam-se já sobre a Europa as nuvens negras que em breve levariam a um conflito generalizado.
Em 1910, Portugal era um país rural e essencialmente agrícola; 78% da população era analfabeta. A maioria das casas não tinha saneamento, nem electricidade, nem sequer casa de banho. O automóvel era uma raridade. A natalidade era elevada, a mortalidade infantil também. As aldeias portuguesas produziam os bens alimentares que o país consumia, mas as importações (sobretudo de bens manufacturados) já superavam as exportações.
Nos 100 anos da República o reinado do carvão deu lugar, progressivamente, ao reinado do petróleo, o mundo transformou-se, surgiu a globalização. O século da República viu multiplicar por quatro a população mundial. Na verdade foi apenas o tempo de um "flash" na história do homem. A televisão, o automóvel, o avião e o turismo e, mais recentemente, a Internet, fizeram do planeta uma "aldeia global".
Portugal perdeu a África, democratizou-se, integrou-se na Europa. Acompanhou o progresso, e alterou a sua forma de viver, passou para o clube dos ricos. Em Portugal temos hoje um Estado Social, ensino gratuito e generalizado, acesso aos cuidados de saúde. A electricidade trouxe o conforto aos nossos lares, e libertou a mulher para o trabalho fora do lar. As pessoas estão protegidas no desemprego e na reforma. E até os mais carenciados não precisam de estender a mão à caridade pois o Estado garante-lhes o sustento.
Mas ao terminar o século da República o mundo começa a perceber que o planeta tem limites, que os recursos são escassos, e que estamos perigosamente a chegar à linha de fronteira, onde se advinha o fim da estrada. E é quando, paradoxalmente, nos pedem para acelerar, em vez de parar e esperar. Trinta e seis anos de democracia não nos podem trazer apenas liberdade de expressão e uma enorme manifestação de dualidade de critérios e irresponsabilidade nas decisões mais importantes para o futuro do País… Sem estratégia nenhuma sobre que sectores devemos ou não apostar e desenvolver.
Por exemplo, os noruegueses e suecos não necessitam de ter linhas TGV, milhares de quilómetros de auto-estradas, luxuosos estádios de futebol, “euros”, políticos e gestores públicos a deslocarem-se em carros de luxo, etc., para serem porventura as melhores e mais justas sociedades europeias, com os salários mais altos do velho continente… E no caso Norueguês nem tão pouco precisa de integrar a Comunidade Europeia.
Naturalmente à nossa pobre democracia faltam práticas fundamentais e uma classe dominante culta, tecnicamente evoluída e actualizada, desprendida de determinados bens materiais e, acima de tudo, educada e com vocação de serviço público. Não é possível fazer uma reforma da Administração Pública na sua base se as cúpulas não forem exemplares e capazes de bons exemplos.
Vamos entrar no segundo século da República, e tudo parece indicar que acaba um ciclo e vai começar outro. Os sinais de que algo está a mudar já são bem evidentes. Alguns já dizem que nós viemos do pior para o melhor, mas que os nossos filhos e os nossos netos irão do melhor para o pior!
Não sabemos é se as pessoas são hoje mais felizes do que eram há cem anos, e é pena não termos esse indicador. Para perceber se valeu a pena. Pois no fundo o que todos queremos é ser felizes.

P.S. -Terminei a minha colaboração no Município de Estremoz onde nos últimos 5 anos prestei serviços de Consultoria de Gestão. Foi uma experiencia enriquecedora e gratificante que termina com um sentido de dever cumprido. Quero aproveitar esta coluna para agradecer toda a amizade e colaboração que senti por parte dos funcionários municipais e desejar-lhes as maiores felicidades pessoais e profissionais.

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